O OE 2021 E AS VIATURAS LIGEIRAS ATRIBUÍDAS AOS TRABALHADORES E ADMINISTRADORES
I – INTRODUÇÃO
A Lei do Orçamento do Estado para 2021 (“Lei do OE 2021”) introduziu, de uma forma sub-reptícia e que provavelmente terá passado despercebida, alterações em sede de tributação autónoma quanto às viaturas ligeiras de passageiros híbridas plug-in atribuídas aos trabalhadores ou administradores e que veio agravar fortemente a carga fiscal que recai sobre as empresas.
Até 31 de Dezembro de 2020, a taxa reduzida de tributação autónoma era aplicável indistintamente a todas as viaturas ligeiras de passageiros híbridas plug-in.
Contrariamente ao que vigorou até ao final de 2020, a Lei do OE 2021 passou a considerar como elegíveis para beneficiar da taxa reduzida de tributação autónoma aplicável às viaturas ligeiras de passageiros híbridas plug-in apenas aquelas cuja bateria possa ser carregada através de ligação à rede elétrica e que tenham uma autonomia mínima, no modo elétrico, de 50 Km e emissões oficiais inferiores a 50gCO2/Km.
E em face desta alteração, justifica-se que as empresas ponderem, como forma de reduzir a sua carga fiscal, a seguinte alternativa: a celebração de acordos escritos entre os trabalhadores ou membros dos órgãos sociais e as entidades patronais sobre a imputação àqueles da utilização da viatura automóvel.
II – DA TRIBUTAÇÃO EM SEDE DE IRC: AS TRIBUTAÇÕES AUTÓNOMAS E OS VEÍCULOS AUTOMÓVEIS
Em traços muitos gerais, o Código do IRC prevê que os encargos efetuados ou suportados por sujeitos passivos deste imposto que exerçam, a título principal, uma atividade comercial, industrial e agrícola, e relacionados com veículos automóveis, estão sujeitos a tributação autónoma.
No entanto, a tributação autónoma não incide apenas sobre o custo de aquisição da viatura automóvel. Existem outros gastos abrangidos, como é, por exemplo, os encargos relativos a depreciações, a rendas ou a alugueres, como também os respeitantes a seguros, à conservação e à manutenção, a combustíveis e aos impostos sobre a sua posse ou a sua utilização.
A tributação autónoma abrange as seguintes viaturas, estando excluídos os demais:
(i) Viaturas ligeiras de passageiros;
(ii) Viaturas ligeiras de mercadorias e de utilização mista (como por exemplo, as viaturas com mais de três lugares e caixa fechada similares aos ligeiros de passageiros, mas classificados como de mercadorias);
(iii) Motos e motociclos;
Por seu turno, e quanto à fonte de energia, a tributação autónoma não abrange os indicados veículos movidos exclusivamente a energia elétrica, sendo aplicável aos movidos a:
(i) Gasolina;
(ii) Gasóleo;
(iii) GPL ou GNV;
(iv) Híbridos plug-in.
Assim, a tributação autónoma incidente sobre os indicados veículos automóveis pode ser sintetizada da seguinte forma:
Legenda:
(1) No caso dos híbridos plug-in, as taxas reduzidas de tributação autónoma são aplicáveis aos veículos ligeiros de passageiros cuja bateria possa ser carregada através de ligação à rede elétrica e que tenham uma autonomia mínima, no modo elétrico, de 50 Km e emissões oficiais inferiores a 50gCO2/Km;
(2) As taxas de tributação autónoma são agravadas em 10% para os sujeitos passivos que apresentem prejuízos fiscal no período a que respeitar o facto tributário. A Lei do Orçamento do Estado para 2021 previu, no entanto, duas disposições transitórias que mitigam o agravamento das taxas de tributação autónoma. Assim, este agravamento não é aplicável nos períodos de tributação de 2020 e 2021:
a). Quando o sujeito passivo tenha obtido lucro tributável em um dos três períodos de tributação anteriores e as obrigações declarativas relativas à entrega da Modelo 22 e da IES tenham sido cumpridas nos termos previstos;
b). Quando estes exercícios correspondam ao período de tributação de início de atividade ou a um dos dois períodos seguintes.
Importa salientar que estão excluídas da incidência de tributação autónoma os encargos relacionados com:
(i) Viaturas ligeiras de passageiros, motos ou motociclos, afetos à exploração de serviço público de transportes, destinados a serem alugados no exercício da atividade normal do sujeito passivo;
(ii) Viaturas automóveis, quando exista acordo escrito entre o trabalhador ou membro do órgão social e a entidade patronal sobre a imputação àqueles da utilização da viatura automóvel.
III – DA TRIBUTAÇÃO EM SEDE DE IRS: AS TRIBUTAÇÕES AUTÓNOMAS E OS VEÍCULOS AUTOMÓVEIS
III.A – AS TRIBUTAÇÕES AUTÓNOMAS EM IRS
Após se proceder à descrição do regime de tributação autónoma em sede de IRC, proceder-se-á seguidamente à descrição do seu correspondente regime em IRS.
Neste contexto, e muito embora o regime em sede de IRS seja essencialmente idêntico, possui algumas subtilezas que importa salientar.
Assim, e à semelhança do que se descreveu em sede de IRC, o Código do IRS também prevê que os encargos incorridos ou suportados por sujeitos passivos deste imposto que possuam ou devam possuir contabilidade organizada, no âmbito de atividades empresariais e profissionais desenvolvidas, e relacionados com viaturas automóveis, são também sujeitos a tributação autónoma.
Sendo que, e também à semelhança do previsto em sede de IRC, os encargos não se resumem aos custos de aquisição. Incluem também as reintegrações, as rendas ou os alugueres, os seguros, as despesas com a sua conservação ou a sua manutenção, com os combustíveis e, por último, os impostos incidentes sobre a sua posse ou a sua utilização, e abrangendo os seguintes tipos de veículos automóveis:
(i) Viaturas ligeiras de passageiros ou mistas;
(ii) Motos e motociclos.
Em sentido coincidente com o previsto no Código do IRC, quanto à fonte de energia, a tributação autónoma não abrange os indicados veículos movidos exclusivamente a energia elétrica, sendo, no entanto, aplicável aos movidos a:
(v) Gasolina;
(vi) Gasóleo;
(vii) GPL ou GNV;
(viii) Híbridos plug-in.
Assim, a tributação autónoma de veículos automóveis em sede de IRS pode ser resumida da seguinte forma:
Legenda:
(1) São excluídos deste regime de tributação autónoma os sujeitos passivos a quem seja aplicado o regime simplificado de tributação.
Por último, refira-se que, em sentido idêntico previsto no Código do IRC, também estão excluídas da incidência de tributação autónoma em sede de IRS os encargos relacionados com:
(i) Viaturas ligeiras de passageiros ou mistas, motos e motociclos, afetos à exploração de serviço público de transportes, destinados a serem alugados no exercício da atividade normal do sujeito passivo;
(ii) Viaturas automóveis, quando exista acordo escrito entre o trabalhador ou membro do órgão social e a entidade patronal sobre a imputação àqueles da utilização da viatura automóvel.
III.B – A TRIBUTAÇÃO DOS VEÍCULOS AUTOMÓVEIS UTILIZADOS POR TRABALHADORES
Conforme acima referido, o regime de tributação autónoma aplicável aos veículos automóveis poderá ser excluído ou eliminado se forem celebrados acordos escritos com os trabalhadores e utilizadores destas viaturas.
Com efeito, o artigo 2.º n.º 3 alínea b) n.º 9 do Código do IRS prevê que se considera como rendimento do trabalho dependente os resultantes da utilização pessoal pelo trabalhador ou membro de órgão social de viatura automóvel que gere encargos para a entidade patronal, quando exista acordo escrito entre o trabalhador ou membro do órgão social e a entidade patronal sobre a imputação àquele da referida viatura automóvel.
Neste contexto, e desde que exista este acordo entre a entidade patronal (sujeita passiva de IRC ou de IRS) e o trabalhador, os encargos relacionados com uma viatura de empresa deixam de objeto de tributação autónoma, para passarem a ser tributados na esfera do trabalhador, em sede de IRS e em sede de Segurança Social.
Em suma, a celebração do indicado acordo de utilização do veículo automóvel determinará ou implicará uma transferência da tributação, como tributação autónoma, na esfera da entidade patronal, para a sua tributação em sede de IRS, no âmbito do trabalhador.
Em face das alterações que o OE de 2021 introduziu em sede de tributação autónoma quanto às viaturas ligeiras de passageiros híbridas plug-in atribuídas aos trabalhadores e administradores que veio penalizar fortemente a carga fiscal das empresas, justifica-se analisar caso a caso e ponderar seriamente esta alternativa que aqui equacionamos, principalmente aquando da contratação dos trabalhadores ou dos administradores, já que é esse o momento adequado para considerar esta opção que não deixa de agravar a carga fiscal do trabalhador/administrador, fazendo, obviamente, as necessárias contas.